segunda-feira, 20 de setembro de 2010

INVENTANDO A VIDA

David G. Garfherewd chegou aos setenta e um anos de vida um tanto debilitado, sempre se apresentava tristonho nos lugares em que era convidado, não gostava muito de falar sobre si ou do livro autobiográfico que havia escrito há seis meses e que há dez semanas consecutivas figurava como o primeiro da lista dos mais vendidos, estava sendo um sucesso estrondoso. Todos se perguntavam como uma pessoa que tivera uma vida tão fascinante, como narrara em seu livro, tornar-se uma pessoa com uma expressão tão triste? Justificava dizendo que se sentia decepcionado com o ritmo de vida após o envelhecimento.
O sucesso do livro de David, fazendo admiradores por todos os cantos do planeta, era resultado da suas narrações de uma vida intensa, cheia de aventuras, muitos amores, viagens, luxos, dinheiro, poder, influência, muitas festas; tudo com sabedoria e equilíbrio, além de ter sido um grande empreendedor. Até as desventuras e gafes eram narradas de uma forma que se tornavam maravilhosas e charmosas. O escritor fora um homem que conhecera quase todos os países e os mais belos lugares do mundo, se relacionou com as pessoas mais importantes da sua época, evidentemente que a maioria dos casos eram sigilosos, vivenciou grandes momentos da história recente, ele era tudo que as pessoas queriam ser, muitos se decepcionavam por não conseguir, ou por falta de dinheiro ou de iniciativa. David era citado em palestras, programas de televisão como um exemplo de sucesso e de vida plena. O mais importante, ele conseguiu tudo isso sem ficar preso a nada ou a ninguém, tendo ócio produtivo.
Outras versões da vida do senhor David começaram vir à tona, parentes, além de outras pessoas que tiveram um relacionamento muito próximo a sua família, mostram um outro lado da vida prodigiosa daquele homem de sucesso, na verdade a biografia de David daria poucas linhas a não ser que se fizesse a lista de vídeos, programas de televisão, livros, jogos eletrônicos e páginas de internet que tenha lido. Com o tempo descobriu-se que, na realidade, sua vida toda ele passou trancado dentro de um quarto. Filho único de um industrial e de uma madame, colunável da alta sociedade, nunca quiseram que o filho corresse riscos, evitando um contato com o mundo violento e sem atrativo que se apresentava lá fora, sempre recebeu tudo sem o menor esforço. O garoto cresceu isolado numa redoma psíquica, os pais morreram, e ele continuou rico, herdando empresas que foram administradas pelos sócios, e David, que não tivera história inicial, sem saber se relacionar com as pessoas, preferiu continuar vivendo a história dos outros através das suas parafernalhas eletrônicas. Via o mundo como se estivesse numa janela.
Apesar de ter sido descoberta a mentira que era a vida de David G. Garfherewd inventada na sua autobiografia, os livros continuaram vendendo bem, não como biografia de um vencedor, mas sim, exemplo de como alguém deveria viver para tentar ser feliz. David descobriu que por mais que mintamos para os outros a verdade continua dentro de nós.
Disso tudo ficou a lição aos seus leitores e admiradores: “Por mais belas que sejam as historias que criamos sobre nós não são mais belas que a vida real e a emoção de nos relacionarmos”. Como diz uma canção do Rei: “Se chorei ou se sorri o importante é que emoções eu vivi”.

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