sábado, 26 de maio de 2012

O LIVRO DA VIDA

Jefferson conheceu a magia dos livros quando, aos oito anos, foi presenteado por um vendedor de materiais escolares com um livro infantil totalmente ilustrado. Era um livro com poucas palavras, mas com belas ilustrações, foi encantamento pleno. A partir daquele dia passou a devorar livros infantis e revistas em quadrinhos. Com quatorze anos já arriscava suas próprias histórias. Não demorou muito começou a sonhar com o lançamento de um livro seu. Aos vinte anos já tinha contos suficientes para lançar seu primeiro livro, mas acreditava que deveria começar com um livro impactante, que fosse sucesso de venda e de crítica e, para isso já tinha uma bela história na cabeça. Entre os estudos do curso universitário ele já preenchia inúmeros cadernos com suas histórias e, paralelamente a isso, escrevia uma longa história que daria o tão sonhado “livro grosso”, daqueles que param em pé - como se descreve os livros com muitas páginas - ele seria o carro chefe de sua gloriosa carreira de escritor. Concluiu o curso universitário, fez um concurso público e se tornou bancário, tinha convicção que o trabalho no banco era temporário, logo seria um escritor famoso e, assim, dedicar-se exclusivamente às letras. Os anos foram passando e, entre esportes, viagens, especializações, namoros, baladas o livro ia sendo escrito e reescrito. Aos vinte e oito anos veio a grande paixão de sua vida, uma bela jovem que estava encantada com o bancário Jefferson e, ao mesmo tempo, embriagada pelas suas histórias, seus sonhos e suas espectativas de uma vida de sucesso. Um ano depois eles se casaram lindamente apaixonados, a festa deu lugar a realidade e, logo vieram as despesas, os compromissos e o bancário Jefferson começou a dar aulas de História numa escola pública noturna, ele tinha convicção que tudo aquilo era temporário, assim que laçasse seu livro tudo mudaria. O livro não foi lançado, mas em cinco anos vieram dois filhos, a carreira bancária estagnada, ganhando mal como professor de escola pública noturno, logo vieram as crises no casamento e, por falta de tempo o livro avançava lentamente. A mulher romântica e que se casara apaixonadamente encantada já acusava Jefferson de ser sonhador demais e de viver com a cabeça no “mundo da lua”, mas Jefferson tinha confiança nos seus objetivos, sabia que havia tomado um rumo um pouco diferente do que havia planejado, mas tudo contribui para um maior embasamento e seu livro teria mais conteúdo. Comentava com os amigos que se já houvesse lançado o livro ele não teria o mesmo embasamento e a mesma consistência que tem agora, apesar dos poucos amigos nunca darem muito crédito aos sonhos do futuro escritor. Os cinqüenta anos chegaram e Jefferson já sonhava com a aposentadoria, que a partir dela teria mais tempo para se dedicar ao livro e o seu lançamento. Cinqüenta e três anos, a dois anos da aposentadoria, dando aulas de História à noite em uma escola pública, com o banco consumindo suas horas diárias diurnas, com filho na universidade, sem tempo para viagens de férias, problemas financeiros, Jefferson viu a crise no seu casamento se agravar, inesperadamente a separação, isso o abalou muito, Jefferson já estava acostumado àquela vida mais ou menos organizada, agora tinha que mudar de casa, não ter a presença da mulher e dos filhos, ele sentiu o impacto, por vários dias andou desnorteado pelas ruas centrais da sua cidade. Desesperado Jefferson até tentou reatar seu casamento, prometeu que mudaria, daria mais tempo e atenção à família, seria menos sonhador, mas não convenceu, não tinha como, pois nem ele estava convencido que mudaria. Cinqüenta e seis anos e chegou a tão esperada aposentadoria, continuou dando aulas no período noturno, estava com mais tempo para se dedicar ao livro. Jéferson tinha inúmeros contos prontos para compor um “livro grosso”, mas queria antes publicar o tão planejado e esperado (por ele) livro que o levaria ao estrelado. O livro que mistura fantasia, pitadas de histórias reais, guerras e dramas pessoais estava com quase oitocentas páginas, Jefferson estava muito orgulhoso, logo iniciou a busca por uma editora. Quase um ano depois, vários “nãos” havia recebido, então veio a proposta mais razoável, uma editora concordou em publicar seu livro, mas eles bancariam apenas cinqüenta por cento das despesas, o restante ficaria a cargo do escritor, depois de pensar e pesquisar mais um pouco, Jefferson topou a proposta. Como não encontrou patrocinadores retirou o pouco dinheiro que estava juntando a fim de comprar um apartamento e aplicou no sonho de uma vida: o livro. Jefferson acreditava muito que teria êxito e muito sucesso na carreira com escritor, apesar de saber que a tecnologia havia tirado muitos leitores de livros de papel. Finalmente chegou o grande dia, numa livraria do shopping da cidade se deu o lançamento do tão planejado livro, foi uma bela festa, muitos amigos estiveram prestigiando, a venda não foi muito boa, mas ele tinha convicção que o lançamento era apenas para dar destaque e que a venda aconteceria no dia a dia com os comentários de boca em boca e com uma boa mídia, mas o livro não aconteceu, a vendagem foi baixíssima, a crítica o ignorou, Jefferson não conseguiu cobrir nem as despesas com a edição e lançamento do livro. Muitos teriam ficado decepcionados e desistiriam, mas não foi o que aconteceu com Jefferson, ele continuava acreditando que era aquele o livro que o levaria ao sucesso, acreditava que apenas as estratégias de divulgação foram erradas. Agora faria uma divulgação mais eficiente, mas para isso precisava de dinheiro, decidiu que buscaria patrocínio, a primeira pessoa a quem procurou foi sua ex-esposa, encontrou-a em companhia do seu novo namorado, um jovem, no mínimo, 15 anos mais novo que ela, Jefferson não se fez de rogado e foi direto ao assunto, solicitou um empréstimo e que o pagaria com a venda de seus livro. A ex-mulher apenas sorriu ironicamente e disparou: - Eu já me livrei de você e de suas malditas fantasias, agora você vem me pedir dinheiro emprestado! Quer me afundar financeiramente com essa ilusão? Vou te dar um conselho: vai procurar alguma coisa útil para fazer! Jefferson falou poucas e boas e saiu da sua antiga casa bufando, não estava desanimado, sabia que estava trilhando o caminho certo e não iria desistir. Em momento nenhum deixou de acreditar que aquele livro o tornaria famoso. Decidido a provar para todos que o seu livro não era apenas uma mera ilusão Jefferson procurou o gerente do banco onde trabalhara e conseguiu um substancial empréstimo e, com ajuda de uns poucos amigos conseguiu levantar um montante financeiro que dava para realizar o seu planejado lançamento bem arquitetado. Assim, contanto com ajuda de uma amiga que trabalhava numa agência de publicidade, planejou minuciosamente sua estratégia de divulgação, enfim o livro foi divulgado na internet, publicidade em jornais e revistas, em comerciais e programas de televisão, por fim fez um lançamento do livro digno dos grandes escritores, agora estava conhecido, era parado na rua, deu até autógrafos. Sucesso? Quer saber do sucesso!? Não esse não veio, a vendagem do seu livro foi muito baixa, não pagou nem o empréstimo que havia feito junto ao banco. Jefferson estava sentado numa cadeira atrás de um velho computador, poucos móveis pela casa, sem família, sem fama, falido, tendo que pagar as dívidas com o salário de bancário aposentado e das poucas aulas que ainda lecionava, com o corpo largado na cadeira estava pensativo, pensou em tudo que tinha vivido, no sonho do livro que lhe traria o sucesso, tomou a decisão que achava mais coerente, que iria acabar com todos os seus sofrimentos, com olhar na tela do computador e decidiu: - Vou escrever outro livro e este, com certeza, vai ser sucesso. Vou começar assim: Tudo pode fracassar, menos os sonhos, quando tudo parecer perdido, tente mais uma vez, sempre...